“O importante não é chegar e sim viajar.” Assim o nosso glorioso Carlos Reichenbach termina o seu Filme Demência, considerado pelo próprio diretor como uma de suas obras mais queridas e autorais. Baseado livremente no mito de Fausto de Goethe, o diretor destila o que seria o pesadelo do seu Fausto (Ênio Gonçalves), um industrial do ramo de cigarros, falido, afundado em dividas, visivelmente insatisfeito, que um dia abandona a mulher infiel, rouba o revolver do porteiro e cai na estrada em busca do seu paraíso imaginário.
Filme Demência é uma realização intencionalmente suja, com uma impressionante atmosfera de sonho ruim ou ainda uma “bad trip”. Inicialmente com seqüências passadas em uma noitada, aonde Fausto começa visitando um cinema pornô, aonde pela primeira vez é interpelado por uma figura que parece ser um demônio, depois o vemos em uma dessas boates inferninho da onde sai com uma menina para um hotel pulgueiro, passando por uma divertida vingança contra seus malfeitores e depois o filme entra em um clima de road-movie (em belas cenas), aonde Fausto sai sem destino em um carro conversível e vai ter seu encontro com o demônio Mefisto (Emílio Di Biasi), aonde será questionado sobre sua própria existência. Será que Fausto não teria uma alma para negociar com o diabo? Interessante que no meio desse surrealismo que exala tensão, citando poesias e pensadores, Reichenbach faz uma critica ácida a política governamental daqueles anos 80, em que se priorizavam os investimentos externos em detrimento ao pequeno e médio empresário que inevitavelmente estavam sendo limados pela concorrência desleal.
Reza a lenda que muito da inspiração para a concepção de Filme Demência veio da própria vida do diretor, que oriundo de uma família abastada de industriais viu a família perder tudo. Ainda interrompido por vários problemas de verbas da Embrafilme, a produção parece ter sido concluída apenas pela boa vontade dos atores e da equipe de filmagem. O que trás a Filme Demência uma aura maldita e toda especial. Provavelmente essa realização foi uma maneira de Reichenbach exorcizar seus próprios demônios, mas se uma coisa teve a ver com a outra no final acabou valendo e muito para esse notável diretor nos brindar com uma das obras mais especiais do cinema brasileiro.
8 comentários:
Gosto e valorizo muito o cinema nacional.
Entretanto, Reinchebach não foi um diretor que me atraiu. Preciso dar uma chance a ele.
Vou começar por Demência.
Valeu a dica.
Já ouvi falar muito deste filme e ele sempre despertou meu interesse pelas referências à peça escrita por Goethe, Fausto é um dos personagens mais importantes da dramaturgia mundial, talvez porque seus conflitos sejam universais... desfazendo a áurea mistica em torno da obra, o que sobra é um indivíduo que vive o conflito entre uma espécie de ética e a busca pelo prazer carnal... Pela sua resenha deu para perceber o filme faz uma desconstrução da história original e a remonta em um novo contexto, fiquei curioso...
Eu preciso criar vergonha na cara e ver logo este filme. Mas bom mesmo seria se saísse numa edição caprichada em dvd e cheio de extras, como LILIAN M. Aí eu faria questão de comprar, como comprei LILIAN M e também GAROTAS DO ABC.
Olá celo! Justo essa fita do Reichenbach que não assisti. Gosto de Dois Córregos e Falsa Loura. O seu cinema é autoral mesmo pelo pouco que vi. Meu professor de cinema Walter Webb, em 2006, havia me falado bastante de sua relação com Reichenbach e nas fitas que já trabalharam juntos. Preciso rever alguns de seus filmes e assistir a sua obra por completo. Interessante algumas curiosidades deste filme.
E chegando na reta final...daqui a pouco um ano em 365 filmes! Só hoje sossegado pude acompanhar suas atualizações diárias!
Abs.
Carlão Reichenbach é um dos nossos grandes cineastas, mas ainda não vi FILME DEMÊNCIA.
O Falcão Maltês
Adoro Filme Demência e todos os outros filmes do Reichenbach. Só não gostei muito de Liliam M - Relatório confidencial.
Renato, assista a todos e confira esse sim, não deixe de ver;
Bruno, é isso q vc disse mesmo, uma descontrução do personagem, inserido em um contexto conteporaneo e algumas braisilidades, além da propria experiecia do diretor;
Ailton, é quase uma heresia vc não ter visto esse filme...hehehe.
Rodrigo, obrigado de coração pela presença constante no blog, seus comentarios são sempre relevantes. Tb gosto desses dois filmes que vc citou. O cinema do Carlão está mais para uma veia autoral. Um dos nossos bons cineastas;
Antonio, veja FILME DEMÊNCIA, grande filme!;
Gilberto, já percebi q vc é fã de cinema nacional de qualidade. Ainda não assisti esse LILIAM M, mas quero confgerir com certeza.
Abs a Tds!
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